A recusa de atendimento para pacientes com doenças crônicas é um problema que gera preocupação e insegurança para muitos brasileiros. Doenças como diabetes, hipertensão, doenças cardíacas, asma e artrite reumatoide são apenas alguns exemplos de condições crônicas que exigem acompanhamento médico contínuo e, em muitos casos, tratamentos de longa duração. A recusa de cobertura ou atendimento médico nesses casos não só coloca a saúde do paciente em risco, mas também configura uma grave violação dos direitos do consumidor e direitos fundamentais garantidos pela Constituição Brasileira.
Este artigo tem como objetivo esclarecer as obrigações legais dos planos de saúde e unidades médicas, os direitos dos pacientes com doenças crônicas, e as ações jurídicas que podem ser adotadas quando ocorre a recusa de atendimento. Vamos abordar a legislação que protege o acesso ao tratamento médico para doenças crônicas e as formas de reverter a recusa.
O que são doenças crônicas e a necessidade de tratamento contínuo
As doenças crônicas são condições de saúde que persistem por longos períodos, muitas vezes pela vida toda, e necessitam de tratamento constante e acompanhamento médico regular. Entre as doenças crônicas mais comuns estão:
- Diabetes tipo 1 e tipo 2
- Hipertensão
- Doenças cardíacas
- Doenças respiratórias, como asma e DPOC
- Doenças renais crônicas
- Artrite reumatoide
- Câncer
O tratamento para essas condições muitas vezes envolve a administração de medicamentos, procedimentos médicos regulares e, em alguns casos, cirurgias. A falta de continuidade no tratamento pode levar ao agravamento da condição de saúde e ao surgimento de complicações graves, como acidente vascular cerebral (AVC), infarto do miocárdio, insuficiência renal ou até morte prematura.
A obrigatoriedade de cobertura para doenças crônicas pela legislação brasileira
No Brasil, a Constituição Federal garante a todos os cidadãos o direito à saúde, sendo este um direito fundamental. Esse direito à saúde está diretamente relacionado com a obrigação do Estado e das operadoras de planos de saúde de oferecer acesso igualitário e universal ao tratamento médico necessário. Além disso, a Lei dos Planos de Saúde (Lei nº 9.656/98) regulamenta as coberturas obrigatórias dos planos de saúde, estabelecendo que estes devem cobrir tratamentos médicos essenciais, incluindo os necessários para doenças crônicas.
Direito à saúde e à dignidade
O artigo 196 da Constituição Federal garante que a saúde é direito de todos e dever do Estado. Esse direito implica a garantia de tratamento médico adequado para todas as condições de saúde, incluindo doenças crônicas. A Constituição também assegura que o paciente tenha acesso ao tratamento necessário para preservar sua vida e dignidade, sendo a recusa de atendimento para doenças crônicas uma violação direta dos direitos humanos e da dignidade da pessoa humana.
A Lei dos Planos de Saúde e a cobertura de tratamentos para doenças crônicas
A Lei nº 9.656/98, que regula os planos de saúde no Brasil, também estabelece que os planos devem garantir a cobertura de procedimentos médicos para doenças crônicas, como consultas regulares, medicamentos e tratamentos especializados. De acordo com a lei, o plano de saúde deve fornecer cobertura integral para tratamentos de doenças crônicas, mesmo que esses tratamentos não estejam expressamente previstos no contrato. Isso significa que, se um médico recomendar um tratamento ou procedimento específico para uma doença crônica, o plano de saúde não pode se recusar a cobrir o tratamento, independentemente do que esteja descrito em cláusulas contratuais.
O Código de Defesa do Consumidor
O Código de Defesa do Consumidor (CDC) também oferece uma proteção significativa aos pacientes que enfrentam a recusa de cobertura para tratamentos de doenças crônicas. O CDC considera que as cláusulas contratuais de planos de saúde que excluem tratamentos essenciais ou que dificultam o acesso a tratamentos médicos necessários são abusivas e, portanto, ilegais. Assim, quando um plano de saúde se recusa a cobrir um tratamento necessário para uma doença crônica, o paciente pode reivindicar seus direitos com base nas disposições do CDC.
Situações comuns de recusa de atendimento para doenças crônicas
Embora a legislação brasileira garanta o acesso ao tratamento para doenças crônicas, ainda é comum que planos de saúde e unidades médicas apresentem justificativas para a recusa de cobertura ou atendimento. As razões mais comuns incluem:
Exclusão de tratamento no contrato
Os planos de saúde podem tentar recusar a cobertura de determinados tratamentos com base em exclusões contratuais. Por exemplo, podem argumentar que certos tratamentos ou medicamentos para doenças crônicas não estão cobertos, ou que o tratamento em questão é experimental ou não previsto no contrato. No entanto, a Lei nº 9.656/98 e o Código de Defesa do Consumidor determinam que qualquer tratamento necessário para a saúde do paciente deve ser coberto pelo plano de saúde, mesmo que não esteja explicitamente previsto no contrato.
Classificação do tratamento como não essencial
Os planos de saúde também podem argumentar que um determinado tratamento para doenças crônicas não é essencial ou urgente, alegando que o paciente pode adiar o tratamento. No entanto, muitas doenças crônicas, como hipertensão e diabetes, exigem tratamento constante para evitar complicações graves. A negativa de cobertura ou recusa de atendimento nesses casos pode colocar o paciente em risco, o que é ilegítimo.
Falta de cumprimento das condições do contrato
Em alguns casos, o plano de saúde pode recusar atendimento alegando que o paciente não atendeu às condições do contrato, como o não cumprimento de exames médicos periódicos ou limitações de idade para certos procedimentos. No entanto, a recusa de atendimento médico em situações de urgência ou necessidade médica não pode ser justificada com base em cláusulas contratuais.
Como reagir diante da recusa de atendimento para doenças crônicas
Quando um paciente enfrenta a recusa de atendimento médico por parte de um plano de saúde ou hospital, existem várias alternativas legais para garantir que seus direitos sejam respeitados.
Reclamação à ANS
A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) é o órgão responsável por regular os planos de saúde no Brasil. Caso um plano de saúde se recuse a cobrir um tratamento para uma doença crônica, o paciente pode registrar uma reclamação formal à ANS. A agência irá investigar a situação e pode aplicar sanções à operadora do plano de saúde, incluindo multas e até interdição da operadora em casos de violação grave dos direitos do consumidor.
Ação judicial
Se a reclamação à ANS não for suficiente, o paciente pode recorrer à via judicial para garantir o acesso ao tratamento necessário. O Judiciário brasileiro tem se mostrado favorável aos direitos dos consumidores em casos de recusa de tratamento para doenças crônicas. O paciente pode ingressar com uma ação judicial pedindo a cobertura imediata do tratamento, bem como solicitar uma indenização por danos morais caso tenha sofrido prejuízos emocionais devido à negativa de atendimento.
Além disso, o juiz pode determinar a realização imediata do tratamento, inclusive concedendo uma liminar que obrigue o plano de saúde a fornecer o tratamento necessário enquanto o processo está em andamento.
Busca por alternativas no SUS
Se o plano de saúde recusar a cobertura e o paciente não puder aguardar a solução judicial, é possível buscar atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Embora o SUS tenha limitações de recursos, ele é obrigado a fornecer atendimento médico, principalmente em casos de emergência ou situações de urgência. Dependendo da situação, a atuação no SUS pode ser uma alternativa para garantir o atendimento necessário.
Jurisprudência sobre a recusa de tratamento para doenças crônicas
A jurisprudência tem se mostrado cada vez mais favorável aos pacientes em casos de recusa de atendimento para doenças crônicas. Em decisões recentes, os tribunais brasileiros têm afirmado a obrigação dos planos de saúde de garantir a cobertura de tratamentos médicos essenciais, independentemente de cláusulas contratuais.
Em muitas decisões, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem reconhecido a ilegalidade da recusa de cobertura para tratamentos de doenças crônicas, especialmente quando o paciente está em risco iminente de agravamento da condição de saúde.
Conclusão
A recusa de atendimento para doenças crônicas por parte de planos de saúde é uma prática ilegal e abusiva que fere os direitos fundamentais do paciente à saúde. A Constituição Federal, a Lei dos Planos de Saúde e o Código de Defesa do Consumidor garantem que qualquer tratamento necessário à saúde, inclusive para doenças crônicas, deve ser coberto pelos planos de saúde.
Se você ou alguém que você conhece está enfrentando a recusa de atendimento para o tratamento de uma doença crônica, é essencial que busque assistência jurídica para garantir que seus direitos sejam respeitados. A reclamação à ANS, a ação judicial e a busca por alternativas no SUS são meios eficazes para garantir o acesso ao tratamento médico necessário e a manutenção da qualidade de vida.