Negativa de cobertura por plano de saúde e a relação com a cláusula de carência

A negativa de cobertura por parte de planos de saúde é uma das questões mais recorrentes no sistema de saúde suplementar brasileiro, gerando grande insegurança entre os beneficiários. Uma das principais razões para a recusa de cobertura está diretamente relacionada à cláusula de carência, que estabelece o período de espera que o beneficiário deve aguardar para ter direito a determinados serviços após a contratação do plano de saúde. Este artigo tem como objetivo abordar a relação entre a negativa de cobertura e a cláusula de carência, explicando os aspectos legais e as implicações para os consumidores.

O que é a cláusula de carência em planos de saúde?

A cláusula de carência é um dispositivo contratual que estabelece um período inicial de espera para que o beneficiário possa usufruir de determinados serviços e procedimentos oferecidos pelo plano de saúde. Durante esse período, que varia conforme o tipo de cobertura e o procedimento solicitado, o beneficiário não tem direito a certos atendimentos ou tratamentos, ainda que esteja pagando regularmente a mensalidade do plano.

A cláusula de carência é permitida pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que regulamenta o setor de saúde suplementar no Brasil. Ela tem como objetivo proteger as operadoras de planos de saúde, evitando que pessoas contratando planos de forma emergencial, com condições pré-existentes de saúde, possam buscar atendimento para tratamentos caros logo após a adesão. No entanto, essa cláusula deve respeitar os limites e as condições previstas em lei.

A legislação sobre carência e os direitos do consumidor

A Lei nº 9.656/1998, que regula os planos de saúde no Brasil, estabelece que a cláusula de carência não pode ser abusiva e deve ser observada de forma que não prejudique o direito à saúde dos consumidores. A ANS, por meio de suas resoluções, também determina que o período de carência deve ser proporcional e razoável, com prazos que variam de acordo com a situação do beneficiário.

De acordo com a legislação, a carência não pode ser superior a 24 meses para procedimentos de alta complexidade ou de longo tratamento, como cirurgias ou tratamentos para doenças graves, e 180 dias para procedimentos relacionados a maternidade. Além disso, a carência não pode ser exigida em casos de urgência e emergência, situações em que o plano de saúde deve cobrir os atendimentos imediatamente, independentemente do período de carência.

Como a cláusula de carência pode gerar negativa de cobertura?

A negativa de cobertura de determinados tratamentos médicos, procedimentos ou internações muitas vezes está relacionada à cláusula de carência. Quando o beneficiário solicita um procedimento ou tratamento durante o período de carência, o plano de saúde pode se recusar a autorizar a cobertura, alegando que o beneficiário ainda não cumpriu o tempo necessário para ter direito ao serviço.

Esse tipo de recusa é legítimo dentro dos limites estabelecidos pela legislação, mas, em muitos casos, a negativa de cobertura pode ser contestada, principalmente quando há abuso na aplicação da cláusula de carência. Por exemplo, se o plano de saúde impuser um período de carência superior ao estabelecido pela ANS ou se recusar coberturas que são de urgência e emergência, essa negativa pode ser considerada indevida.

Além disso, em alguns casos, os planos de saúde podem alegar que o beneficiário está solicitando um tratamento para uma condição preexistente, o que também pode gerar negativa de cobertura. No entanto, a carência para tratamentos de condições preexistentes é limitada pela legislação, e a negativa nesse caso deve ser devidamente justificada, considerando as exigências legais.

A relação entre carência e condições preexistentes de saúde

Um dos maiores pontos de conflito relacionado à cláusula de carência é a cobertura de tratamentos para condições preexistentes de saúde. A Lei nº 9.656/1998 estabelece que as operadoras de planos de saúde podem aplicar carência para condições preexistentes, ou seja, para doenças ou lesões que o beneficiário já possuía no momento da contratação do plano. Nesse caso, a operadora pode exigir um período de carência de até 24 meses para cobrir tais condições.

Entretanto, existem algumas regras importantes a serem observadas. Primeiramente, a operadora do plano de saúde deve informar claramente ao beneficiário sobre a carência para condições preexistentes no momento da adesão ao plano, através de um documento que especifique essa cláusula. Além disso, a operadora não pode negar cobertura para o tratamento de condições preexistentes caso o paciente tenha cumprido o período de carência estipulado.

A recusa de cobertura com base em condições preexistentes, mesmo após o cumprimento da carência, pode ser contestada judicialmente, especialmente quando o plano de saúde não forneceu informações claras sobre essa cláusula no momento da adesão ou quando a recusa de cobertura gera prejuízos ao paciente.

Como contestar a negativa de cobertura com base na carência?

Quando um beneficiário se depara com a negativa de cobertura devido à cláusula de carência, ele tem algumas opções para contestar a decisão e garantir o atendimento necessário. A seguir, abordamos as principais formas de contestar a negativa de cobertura:

1. Recurso administrativo junto à operadora

O primeiro passo para contestar a negativa de cobertura é tentar resolver a questão administrativamente, entrando em contato com a operadora do plano de saúde. A solicitação de revisão pode ser feita por meio de um recurso administrativo, onde o beneficiário apresenta os argumentos de que a negativa é indevida e solicita a cobertura do tratamento, com base na legislação e nos direitos previstos no contrato.

2. Reclamação junto à ANS

Se a operadora do plano de saúde não resolver a questão de forma satisfatória, o beneficiário pode recorrer à ANS, que é o órgão regulador do setor de saúde suplementar no Brasil. A ANS oferece um canal de atendimento ao consumidor, onde é possível registrar reclamações e pedir a intermediação na solução de conflitos. A ANS também pode fiscalizar as operadoras e aplicar penalidades quando houver violação das normas estabelecidas.

3. Ação judicial para revisão da negativa

Quando a negativa de cobertura não é resolvida administrativamente, o beneficiário pode ingressar com uma ação judicial para garantir a cobertura do tratamento. O judiciário tem se mostrado favorável ao direito à saúde, priorizando a proteção do paciente, principalmente em casos em que a negativa de cobertura coloca em risco a saúde ou a vida do beneficiário.

Em muitas situações, o juiz pode conceder uma tutela de urgência, determinando que o plano de saúde forneça o tratamento imediatamente, independentemente do cumprimento da carência, caso se trate de um procedimento de urgência ou emergência. Além disso, o paciente pode solicitar indenização por danos materiais ou morais caso a negativa tenha causado prejuízos significativos.

Danos materiais e morais causados pela negativa de cobertura

Além de solicitar a revisão da negativa, o beneficiário pode pleitear indenização por danos materiais e morais. Os danos materiais são relacionados aos gastos adicionais que o paciente teve que arcar para realizar o tratamento, como o pagamento de custos extras ou a compra de medicamentos que deveriam ser cobertos pelo plano de saúde.

Já os danos morais podem ser pleiteados quando a negativa de cobertura causou sofrimento emocional ou psicológico ao beneficiário, como nos casos de tratamentos de urgência que não foram autorizados a tempo. O judiciário tem reconhecido a ocorrência de danos morais em situações de negativa indevida de cobertura, principalmente quando se trata de tratamentos essenciais à saúde.

Conclusão

A cláusula de carência é uma das principais causas de negativa de cobertura por planos de saúde e gera um impacto significativo nos beneficiários. Embora seja uma prática regulamentada, a aplicação abusiva dessa cláusula pode ser contestada judicialmente, especialmente quando a negativa de cobertura prejudica o direito à saúde ou ocorre em situações de urgência. O beneficiário tem o direito de buscar a revisão da negativa de cobertura por meio de recursos administrativos, reclamações à ANS ou ações judiciais, visando garantir o acesso ao tratamento médico necessário e a reparação por eventuais danos causados.

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